Terça-feira, Novembro 26, 2024

Notícia boa não interessa

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Por Alberto Villas

Quando o meu pai colocava o boné na cabeça e os óculos Ray-Ban no nariz, era sinal de que iria viajar. Pegar aquelas estradas horrendas do interior de Minas, que só tinham buraco e lama na época de chuva, buraco e pó na época de seca. 

Minha mãe acendia uma vela no altar que tinha no quarto dela, que só era apagada quando ele dava notícia de que chegara ao destino, geralmente uma cidadezinha pra lá do fim do mundo. 

– Mande notícias! Dizia ela, quando ele metia o pé no acelerador daquele velho Land-Rover 58. 

O meu pai argumentava que não precisava – ou era impossível – mandar notícias, primeiro porque não tinha telefone e, segundo, porque notícia ruim chegava rápido. Era um velho ditado que todos usavam muito, esse tal de notícia ruim chega rápido. 

Hoje a coisa mudou um pouco. Noticia ruim chega, além de rápido, a todo o momento. Basta abrir o jornal, clicar em qualquer site de notícia ou ligar a televisão num telejornal. 

Jornalista hoje virou caçador de notícia ruim, porta-voz da tragédia. Seja tragédia aérea, grega, econômica, política, vale tudo. Se levarmos a sério todas essas manchetes que pipocam a cada momento, chegamos à conclusão de que o Brasil respira com ajuda de aparelhos e não passa desse final de semana. 

Quando eu ainda trabalhava em redação – lembro-me bem – criticava-se muito aquelas matérias que chamávamos de matérias ONG, tipo o país que dá certo, gente que faz, coisas que funcionam. Criança tocando violino na favela, ensaiando balé na periferia, velhinho animado fazendo hidroginástica.

E o furo? Hoje só é considerado furo, um escândalo bem cabeludo. Escandalozinho não vale. 

Basta dar uma olhada nas manchetes para perceber que o objetivo agora é deixar bem claro para o leitor que o Brasil vai de mal a pior. 

Essa semana começou assim, bem cedo, com uma manchete do UOL: 

Roubos e furtos caem no primeiro semestre, mas assaltos a bancos crescem em SP .

Virou uma obsessão. Mesmo com uma notícia boa, é preciso encontrar um viés negativo pra virar manchete, um mas, por exemplo. Coisas do tipo: 

“O tempo vai melhorar hoje, mas vai chover no final de semana”

“O preço do tomate cai, mas o xuxu tem alta”

“Ranking da educação melhora, mas ainda estamos atrás da Argentina”

O mas está sempre lá nas manchetes e se você observar bem, tudo piorou foi nos últimos 12 anos. Não sei porque (risos). 

Dólar tem a maior alta nos últimos 12 anos. 

Preço do automóvel é o mais elevado nos últimos 12 anos. 

Poder de compra diminui e já é o menor em 12 anos. 

Preço do aluguel tem o maior reajuste desde 2003.

Além de caçador de noticia ruim, jornalista virou detetive. 

Basta ter um ministro novo na praça que uma legião de caçadores de noticias ruins entra em ação.

Precisamos descobrir alguma falcatrua desse novo ministro! De assédio sexual a uma ultrapassagem pelo acostamento. De um desvio de verba a uma empregada doméstica que ele não registrou. Alguma coisa contra ele precisa ser encontrada, pra termos uma manchete no dia seguinte. 

Noticia boa não interessa.

Vivemos uma época em que é preciso valorizar a falência, bombar os números negativos, ver o lado ruim das coisas. Parece que os mancheteiros de plantão soltam fogos quando a inflação sobe, fazem tintin quando o PIB cai, comemoram até um arroto de delator.

Tudo isso me faz lembrar uma velha manchete do Planeta Diário que, pelo menos, era engraçada:

Médici morre, mas passa bem!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

*Marco Antonio Poletto é Gestor no Poder Judiciário, Historiador, Articulista e Animador Cultural

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