Ex-caminhoneira por 18 anos, e ex-negociante de hortifrúti, muito simpática e falante, a estudante do último ano do curso de Gestão Empresarial da Fatec Jales, Vânia da Silva, 39 anos, preside a Coopersol (Cooperativa Solidária de Catadores de Reciclável de Jales) desde 31 de janeiro. Ela é a personagem que abre o novo quadro do jornal A Tribuna. A partir desta edição, este semanário vai publicar entrevistas semanais com personagens cujas atuações nas suas áreas trazem reflexos na comunidade em geral.
Animada com recursos de mais uma emenda parlamentar para ampliação da área coberta da Cooperativa, Vânia tem muitos planos. Pretende começar a triturar vidro e pneus, intensificar a coleta de recicláveis na zona rural e atrair para a cooperativa boa parte dos catadores autônomos. Ela própria é uma cooperada e gosta de repetir uma frase que representa a necessidade de tomar decisões embasada em dados concretos. “Não há gestão sem informação”.
Confira o bate-papo trocado na tarde da última quarta-feira, 15, enquanto mais um caminhão recolhia dezenas de bags de garrafas que seriam vendidas para uma empresa de Ribeirão Preto.
A Tribuna: Quantas pessoas tiram o seu sustento da Coopersol atualmente e quanto vocês reciclam mensalmente?
Vânia da Silva: Hoje a cooperativa vende mensalmente, cerca de 100 mil quilos de material reciclável, entre vidro, metal, plástico. Temos 25 cooperados e os ganhos de cada um são calculados conforme a hora de trabalho porque alguns trabalham mais horas do que outros. Tiramos todas as despesas com manutenção dos veículos, energia elétrica, escritório e dividimos o que resta entre todos nós. Mas existe a possibilidade de reciclarmos muito mais.
A Tribuna: Reciclar mais quanto?
Vânia da Silva: Um levantamento de Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente mostra que diariamente são recolhidos 40 mil quilos de lixo das ruas de Jales. Mensalmente isso chega a 1,180 milhões. Desse total, 450 mil quilos são de material reciclável, mas apenas 100 mil vem para a Coopersol. O resto, cerca de 350 mil quilos, são enterrados no aterro sanitário. É dinheiro, emprego, renda e dignidade que estão sendo enterrados, reduzindo a vida útil do aterro e que podem prejudicar a natureza.
Se a gente olhar para o lado social, se todo esse volume de material que está sendo enterrado viesse para a cooperativa, teríamos que contratar mais pessoas e aumentaria a renda de quem trabalha aqui, deixando a cidade mais limpa. Reciclar não é só questão de salvar o meio ambiente,é gerar emprego para as famílias.
A Tribuna: Vocês pegam todo o tipo de material?
Vânia da Silva: Todo o tipo. Eu costumo dizer que na dúvida, se o material é reciclado ou não, mande para nós que aqui nós separamos o que pode ou não ser aproveitado. Temos uma mesa de triagem e uma equipe que trabalha fazendo a separação e classificação do material, colocando o que é vidro, papel, plástico, latinha, pet no seu respectivo bag. O que for lixo, separamos para o recolhimento.
A Tribuna: Qual a maneira mais correta para a população separar o reciclável do lixo comum?
Vânia da Silva: Precisa ter apenas de dois recipientes, dois sacos. Um para colocar o lixo comum e o outro para o reciclável. Não precisa separar por material. Pode colocar vidro, inteiro ou quebrado, latinha, pet, plástico, papelão…tudo junto no mesmo saco porque, como eu disse, aqui nós fazemos a separação. Não tem necessidade dessas lixeiras coloridas para cada tipo de material, como a gente vê na rua. A gente pode acabar com essa burocracia. Aliás, se tivesse apenas um recipiente para colocar reciclável, em vez daquelas lixeiras que a gente vê por aí, as pessoas iriam reciclar muito mais porque fica mais simples. Ninguém gosta de confusão na cabeça.
A Tribuna: Existe uma possibilidade de vocês fazerem aqui mesmo a moagem de material delicado, como vidro e até pneus. Como é isso?
Vânia da Silva: Sim. Estamos estudando a possibilidade de moermos o vidro aqui mesmo na cooperativa para isso, estamos buscando parcerias para instalar as máquinas. Atualmente, vendemos o vidro a R$0,13 o quilo e a partir do momento que ele for moído, poderemos agregar muito mais valor porque vamos entregar para as indústrias o vidro em outra fase e podemos cobrar cerca de R$ 3,00 o quilo. É uma diferença muito grande. Nesta semana, estivemos na Exposucata, em São Paulo, e conhecemos uma máquina de triturar pneu. Ela separar o aço e a borracha e tritura a borracha. Com ela, poderíamos aumentar a produção e a coleta, tirando os pneus que muitas vezes estão em local irregular, criando mosquito, enquanto agregamos valor ao material que reciclamos.
A Tribuna: Recentemente, vocês receberam mais uma emenda parlamentar para ampliação. Pode contar mais?
Vânia da Silva: Sim. Recebemos uma emenda de R$ 350 mil da deputada Analice Fernandes que vamos usar para construir um outro galpão, que vai dobrar a área coberta. Nesse galpão de aproximadamente 500 m², vamos colocar a esteira que está parada por falta de espaço e todo o material que fica ao relento. Eu vou conseguir armazenar muito mais material e atrair as indústrias. O prefeito Luís Henrique também esteve aqui, com a secretária Sandra Gigante, e anunciou que vai acabar com essa área de terra aqui na frente, então vai ficar muito mais fácil para os caminhões manobrarem.
A Tribuna: Como é este projeto novo de recolhimento de reciclável na zona rural, o projeto Campo Mais Limpo?
Vânia da Silva: Com esta carência de reciclável, nós precisando de volume e percebendo que na zona rural também precisava desta limpeza, nós decidimos fazer o projeto Campo Mais Limpo. Eu procurei a Sandra Gigante e pedi ajuda para ela para desenvolver e a divulgar. Deu muito certo! Começamos com um projeto piloto em apenas quatro locais, no Córrego do Tamboril, Quebra-Cabaça, Jataí e Barra Bonita e logo no primeiro dia coletamos 2 toneladas de reciclados. Isso porque nem todos os agricultores ficaram sabendo e ainda estamos ampliando a divulgação. Quando todos estiverem informados, o volume será muito maior.
A Tribuna: E vocês têm estrutura para isso? Quer dizer, tem caminhões, pessoal e não vai atrapalhar a coleta urbana?
Vânia da Silva: Temos quatro caminhões trabalhando: três da Prefeitura que são dois gaiola e um caminhão prensa, e um caminhão-baú que é de uma licitação da Prefeitura. É apenas esse caminhão que vai fazer a coleta na zona rural, então não desfalcou.
A Tribuna: Você falou sobre a proporção grande do que é reciclado e o que poderia ser. Apenas uns 20% do reciclável vem para a Coopersol. Porque tem tanto material desperdiçado? Onde está o nó?
Vânia da Silva: Não vem tudo para a reciclagem por causa da própria população. A conscientização ainda não chegou a todos.Quando houver a consciência da população que quando ela joga o material reciclável no lixo ela está jogando fora o salário, emprego, diminuindo a vida útil do aterro, ela vai ter a consciência de que aquilo não é lixo, é vida, é salário digno, sustento para várias famílias, pode ajudar a salvar a vida de muitas pessoas e ajudar o meio ambiente.
A Tribuna: Como vocês encaram a atuação dos catadores autônomos, aqueles que saem pelas ruas de madrugada para pegar o material antes de vocês e que ficam pelas festas e eventos?
Vânia da Silva: Segundo a Secretaria de Agricultura, Jales tem 30 catadores independentes. Todos estão cadastrados com endereço, nome etc. Hoje estamos com um trabalho junto com o CRAS, a Vigilância Sanitária e a Secretaria da Saúde justamente voltado para esses catadores autônomos. Porque eles acabam armazenando por muito tempo de forma irregular porque precisam de volume para vender e isso atrai rato, mosquito, causa mal cheiro…Aqui na cooperativa nós armazenamos tudo da forma legal em local apropriado. Estamos procurando todos esses catadores para negociar o material deles e futuramente, quando aumentar o volume de reciclagem, podemos gerar emprego para essas pessoas aqui dentro da cooperativa.
A Tribuna: Vocês já pensaram em fazer uma espécie de lojinha, exposição, feirinha para vender produtos que não vão pra reciclagem ou artesanato com reciclável?
Vânia da Silva: Nós estamos guardando material que pode ser reaproveitado, mas não serve nos cooperados para fazer um bazar solidário. Todo o material que estiver em bom estado, como roupa, calçado, tapete, panela, ferro de passar… vai ser reformado e vendido por preço simbólico justamente para ajudar nas despesas da cooperativa.