Uma discussão entre dois jovens em uma rede social, que teve início com uma crítica aos apreciadores do gênero sertanejo e aos fãs do falecido cantor Cristiano Araújo, foi parar na Vara Especial do Juizado Cível e Criminal de Jales, com um pedido de indenização por danos morais. Tudo começou com uma postagem de um rapaz – R.S. – apoiando artigo do apresentador de TV, Zeca Camargo, a respeito da comoção que envolveu a morte do cantor Cristiano Araújo em acidente automobilístico em uma estrada de Goiás, em junho deste ano. No texto, escrito para o Jornal das Dez, da GloboNews, Zeca disse, entre outras coisas que uma multidão de brasileiros teria ficado comovida pela morte de um artista desconhecido e que “de uma hora para outra, fãs e pessoas que não faziam ideia de quem era Cristiano Araújo partiram para o abraço coletivo”.
Além de defender a opinião de Zeca, o jovem jalesense afirmou que “o público sertanejo é ridículo… agora morre um cantorzinho qualquer, sem nenhum diferencial, sem nem um grande peso pra musica e ele vira um ídolo nacional imune a críticas e fala-se dele em todos os jornais durante semanas?”. Antes R.S. já tinha dito que “os fanáticos por esse tipo de cantor ou de música precisa é voltar para escola e abrir um pouco mais sua cabeça…”.
A opinião não agradou à jovem M.G.M., que criticou o rapaz, afirmando que “… desde a época que te conheço você está na mesma m… cantando seu rock medíocre, enquanto o Cristiano Araújo, em apenas cinco anos, virou um dos maiores cantores sertanejos do Brasil, com as músicas dele sendo as mais tocadas em todas as rádios… você não é ninguém para falar dele, muito menos o Zeca Camargo”. A réplica do jovem roqueiro veio com alguns decibéis a mais. Ele disse que conhecia a garota desde os tempos de colégio e que ela “era uma das garotas mais ‘rodadas’ da escola…”.
Depois da troca de ofensas, o assunto foi parar na Justiça. A moça ajuizou uma ação, com pedido de liminar, onde solicitava que o rapaz retirasse de sua página, no facebook, as considerações que fez sobre ela. A jovem pleiteou, também, uma indenização por danos morais, no valor de R$ 7 mil. A liminar foi, no entanto, negada pelo juiz da Vara Especial, Fernando Antonio de Lima. Para o magistrado, não seria lógico obrigar o rapaz a retirar todas as menções feitas à moça. Ele lembrou que foi a moça quem se expôs voluntariamente ao debate público ao entrar no Facebook do rapaz.
Depois de ressaltar que ambos os gêneros musicais – o sertanejo e o rock – cantam o amor e a solidariedade entre as pessoas, e explicar que a decisão inicial é provisória, “podendo ser mantida ou mudada no transcorrer do processo, segundo as provas produzidas”, o magistrado propôs a realização de uma audiência de conciliação para que ambos os jovens tenham a oportunidade de se nutrir dos sentimentos das músicas que amam, quais sejam, o amor e a solidariedade. A audiência de conciliação está marcada para o próximo dia 22 de setembro.
Se depender da moça, é provável que a audiência seja bem sucedida. Afinal, apesar de se dizer fã da música sertaneja e classificar de “medíocre” o rock do rapaz, ela já postou em sua página, no Facebook, uma frase do roqueiro Renato Russo, que trata exatamente do amor, um dos sentimentos invocados pelo magistrado Fernando. Segundo a frase do falecido líder da Legião Urbana, postada pela jovem, “o amor verdadeiro nunca vai te fazer sofrer, pois quem ama cuida, não magoa e nem decepciona… Não busque pessoas perfeitas, porque não somos! Busque apenas pessoas que te valorizam”.
A decisão
Abaixo, o trecho final da decisão do juiz Fernando Antonio de Lima:
“O rock canta as modificações nos costumes, a revolta, a transformação de uma sociedade egoísta numa sociedade solidária. A música sertaneja, por sua vez, a de Cristiano Araújo, em específico, fala muito de amor. Em nome do amor e da solidariedade marcas fundamentais das músicas admiradas por Mariana e Rafael proponho o seguinte: audiência de conciliação, para que ambos se nutram dos sentimentos que a música, que amam, personifique neste processo. Para tanto, proponho, a qualquer um dos dois, sem que isso seja reconhecimento de culpa, mas gesto de amor e solidariedade: uma cesta básica, ou qualquer outro valor, ou roupa, ou qualquer coisa que seja, a ser destinada aos Migrantes (Rua 9, quarteirão abaixo do fórum), esses nossos irmãos, filhos da triste sorte da vida, que os retirou do aconchego dos familiares. Designe-se, pois, audiência de conciliação, intimando-se a ambos, para, se se conciliarem, levarem juntos os alimentos aos Migrantes, com um amoroso (música sertaneja) e solidário (rock) aperto de mão”.
Fernando Antônio de Lima
Juiz de Direito